Gravações de "A vida privada de Salazar" recriam S. Bento
00h54m
ELSA PEREIRA
"Prefiro que me temam a que me amem". A frase pertence a Diogo Morgado na pele do mentor da ditadura, papel que encarna na minissérie "A vida privada de Salazar". O JN assistiu às gravações de cenas que vão figurar na grelha da SIC.
O sol intenso que brindou a cidade de Lisboa com um calor que afugenta os corpos não se fazia sentir no interior do palácio requisitado para cenário desta produção de Carnaxide. S. Bento não só viajou no tempo até ao Estado Novo, como no espaço até ao Largo de Santa Catarina, com uma privilegiada vista sobre o Tejo. O presidente do Conselho estava, pois, em acção, junto com o seu amigo próximo Mário Figueiredo, o ministro da Justiça de então, interpretado por João Lagarto.
Por entre as horas de espera para se espreitar o sóbrio aparato que envolvia a actividade política do ditador, ecoavam vozes de fundo a requerer silêncio. Afinal, grava-se a faceta política do homem que comandou os destinos do país durante cerca de 40 anos, o que indelevelmente marcou os portugueses. Pese embora a minissérie se centre na esfera íntima de Salazar, desvelando suas paixões, algumas concretas, outras platónicas, o lado estadista não poderia ficar omisso.
Entretanto, fomos encontrar Margarida Carpinteiro, que veste a pele de Maria, a governanta de Salazar, que se encontrava no processo de maquilhagem. Cerca de uma hora é o tempo que leva a abandonar-se para encarnar a personagem. Nada que se compare com a maratona de caracterização a que Diogo Morgado tem de se sujeitar para respirar ditadura: perto de três horas.
Interrogada se mudou a sua opinião relativamente a Salazar ao privar com esta vertente mais intimista da vida dele, responde: "Pelo contrário, ao explorar-se a sua vida privada, reconhece-se a maneira de governar, é um reflexo do homem fechado ao Mundo, encerrado numa paz podre". A actriz considera que, apesar de se revestir de poder, "ele era um homem profundamente infeliz".
Segundo Margarida, Maria, ao contrário do que se especula, nunca chegou a consumar uma relação amorosa com Salazar. "Era uma pessoa da sua confiança que talvez nutrisse por ele uma paixão cerceada", o que acabou por se converter num instinto "maternal, protector", revela a actriz. "É gratificante poder participar num trabalho desta natureza qualitativa, principalmente para uma mulher da minha idade, que foi vítima da governação de Oliveira Salazar", remata.
Após mais largos minutos de delonga, foi então possível chegar à fala com João Lagarto, que descreveu o seu papel. "O Mário Figueiredo foi colega de faculdade de Salazar e sempre foi muito próximo dele, influenciando-o politicamente". O actor confidencia que dar corpo a uma personagem que efectivamente existiu "coloca problemas particulares" e acrescenta: "Quando estão mortos, parece uma espécie de espiritismo, como se o tipo estivesse a controlar todos os passos".
Lagarto elucida que Mário Figueiredo "não perpassa toda a trama da minissérie", até porque a mesma incide primordialmente na vida privada e não na vida política de Salazar. No entanto, a par das personagens de Duarte Pacheco e do cardeal Cerejeira, Figueiredo tem a função de contextualizar importantes períodos históricos na série, bem como de a pintar com tonalidades políticas.
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