segunda-feira, setembro 1

Quer ver coisa diferente? Vá ao museu Masp?

Ipiranga? Que nada. SP tem outros acervos tão curiosos que chegam a surpreender os freqüentadores

Edison Veiga

"Tudo o que é falado me interessa." Eis o lema que o jornalista Luiz Ernesto Kawall segue obsessivamente há mais de 40 anos. Acabou criando um museu cujo acervo são vozes - de 3 mil donos diferentes. Tem para todos os gostos: discursos de Adolf Hitler, Carlos Lacerda e Lênin; narrações futebolísticas de Geraldo José de Almeida; depoimentos de Thomas Edison, Ernesto Che Guevara e Sigmund Freud; e até uma entrevista concedida, jura Kawall, pelo cangaceiro Lampião em 1991, durante uma sessão em um centro de umbanda.

Assim como o jornalista, outros paulistanos transformaram em museu seu tema predileto. É o caso do mágico Basilio Artero Sanchez, conhecido como Mister Basart. Fascinado por números ilusionistas, ele começou a se corresponder com mágicos do mundo nos anos 1970. Em 1982, decidiu exibir todo o material que reuniu. Hoje, há mais de 60 mil itens no acervo do Museu da Mágica - reportagens, documentos, cartazes e aparelhos. E quem o visita ainda assiste a alguns números apresentados pelo próprio Basart. "Meu museu é pequeno, mas quem vem pode conferir ao vivo o que está na parede, pois eu acompanho cada visitante", diz ele.

Inaugurado há um ano e meio, o Museu da Matemática era sonho antigo do físico aeroespacial Aguinaldo Pradini Ricieri, pesquisador do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). "Com ele, mostro que a matemática existe para ajudar a resolver problemas", apregoa. Quem se aventura a conhecer mais a fundo esse mundo que a muitos traz lembranças desagradáveis dos tempos de escola, encontra peças como círculos trigonométricos e ciclóides metálicos, em meio a quadros e bancos (ao estilo desses de praças) que homenageiam célebres matemáticos da história. Nos fins de semana, o espaço oferece palestras gratuitas.

Já a idéia do técnico em informática José Carlos Valle vingou por apenas dois anos. Ele reuniu quinquilharias tecnológicas - entre elas, um mouse de madeira de 1964 e um disco rígido de 20 quilos - e criou, em 2005, o Museu do Computador. Acabou precisando fechá-lo por dificuldades de manutenção. "Mas quero reabri-lo logo", avisa. "Preciso apenas de uma equipe para me ajudar com esse projeto." Por enquanto, os cerca de 15 mil itens de seu memorial ficam guardados. Parte em três galpões de amigos, parte em casa. A quem se interessar, Valle se dispõe a levar alguns em apresentações em escolas, universidades, feiras de ciências e outros eventos.

Tais exemplos provam que nem todo museu precisa ter quadros nas paredes ou cultivar aquele silêncio contemplativo em seu interior. Entre os cerca de cem que existem na capital paulista, alguns se destacam justamente pela excentricidade do acervo. É possível encontrar palitos de dente com sabor (no Museu das Invenções), bustos de bandidos famosos (Museu do Crime), um bimotor DC-3 usado na 2ª Guerra Mundial (Museu da Tecnologia) e roupas, gravatas, sapatos e luvas (Modateca).

NEGÓCIO PRÓPRIO

Também há os que montam museus exibindo peças antigas que se relacionam à empresa que tocam. A iniciativa é bacana por muitas razões. Além do valor cultural, o empresário ainda acaba atraindo os holofotes para seu negócio e, de quebra, arrebanhando novos clientes. "Muitas pessoas vêm ao museu e acabam se interessando pela loja", admite a jornalista Ivani Migliaccio, responsável desde 1997 pelo Museu dos Óculos, que funciona no mesmo casarão que abriga uma das unidades da ótica Miguel Giannini Óculos. As peças começaram a ser colecionadas por Giannini aos 13 anos - hoje ele tem 66.

O museu foi aberto em 1996 com pouco mais de 50 itens. Atualmente, há 700. "Originalmente, não era uma ferramenta de marketing", diz Ivani. "Foi algo que nasceu do gosto pessoal do proprietário da empresa." Exemplo semelhante é o Museu do Relógio, fruto da paixão do empresário Dimas de Melo Pimenta. Relógio é um dos diversos itens fabricados por sua empresa, a Dimep. O memorial foi criado em 1975, com sua coleção particular.

Como bom italiano (radicado no Brasil desde 1976), o empresário Enrico Vezzani é um aficionado por macarrão. Juntou balanças antigas, fogão à lenha e diversas máquinas que serviam para fazer massas e abriu o Museu do Macarrão. Funcionou até o ano passado na sede da Zini Produtos Alimentícios, no bairro do Limão. Acabou virando uma cantina. "Estamos analisando se iremos reabri-lo em um galpão ou na carreta de um caminhão, como museu itinerante."

RELIGIOSIDADE

A entrevista que teria sido dada pelo espírito de Lampião ao dono do Museu da Voz não é o único caso, digamos, mediúnico em exposição na cidade. Na Lapa, o Instituto de Cultura Espírita de São Paulo mantém o Museu Espírita. Entre as peças, um busto de Allan Kardec, um mapa assinalado com as rotas de suas viagens para disseminar o espiritismo - foram 268 localidades de 38 países em 12 anos, a bordo de uma charrete - e um acervo de 4.600 livros. O mais curioso, entretanto, são os quadros pintados no centro espírita contíguo ao museu. Com traços similares ao de grandes artistas plásticos da história, são atribuídos aos espíritos de Picasso, Di Cavalcanti, Monet, Renoir e outros.

Em Barueri, na Grande de São Paulo, fica o Museu da Bíblia, organizado pela Sociedade Bíblica do Brasil. Em uma área de 900 metros quadrados, o acervo traz textos religiosos em mais de 200 idiomas e uma réplica da prensa de Gutemberg. Também podem ser vistos ali materiais que aparecem nas escrituras, como trigo, joio, água do Rio Jordão e do Mar Morto e algumas sementes de mostarda.

A ampla variedade de museus de São Paulo não atrai apenas os moradores da cidade que adoram passeios cult. Levantamento da São Paulo Turismo mostra que 83% das pessoas que vêm de fora já visitaram ou pretendem conhecer ao menos um desses espaços. "Mas infelizmente os museus, de modo geral, estão despreparados para receber turistas", lamenta o museólogo Andre Angulo, do Grupo de Trabalho em Turismo Cultural da Associação Brasileira de Museologia.


SERVIÇO

Modateca: Avenida Engenheiro Eusébio Stevaux, 823, Santo Amaro. Telefone: 5682-7455. Grátis.

Museu da Bíblia: Avenida Pastor Sebastião Davino dos Reis, 672, Vila Porto, Barueri. Telefone: 4168-6225. Grátis.

Museu da Mágica: Rua Silva Bueno, 519, cj. 42, Ipiranga. Telefone: 2061-7373. Site: www.museudamagica.com. R$ 18,00 (dias úteis) e R$ 30,00 (fim de semana). É preciso agendar.

Museu da Matemática: Rua Gaspar Lourenço, 64, Vila Mariana. Telefone: (12) 3931-7281. Grátis.

Museu da Tecnologia: Avenida Engenheiro Billings, 526, Jaguaré. Telefone: 3768-5785. Site: www.museutec.org.br. Grátis.

Museu da Voz: Praça Benedito Calixto, 86, ap. 62, Pinheiros. Telefone: 3062-0015. Grátis. Agendar.

Museu das Invenções: Rua Doutor Homem de Mello, 1.109, Perdizes. Telefone: 3873-3211. Site: www.museudasinvencoes.com.br. R$ 10,00.

Museu do Crime: Praça Professor Reinaldo Porchat, 219, Butantã. Telefone: 3039-3460. Grátis.

Museu do Relógio: Avenida Mofarrej, 840, Vila Leopoldina. Telefone: 3646-4000. Site: www.dimep.com.br. Grátis.

Museu dos Óculos: Rua dos Ingleses, 108, Bela Vista. Telefone: 3149-4000. Site: www.miguelgiannini.com.br. Grátis.

Museu Espírita: Rua Guaricanga, 357, Lapa. Telefone: 3834-6225. Grátis. Agendar.
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