Sento na poltrona da sala desta casa cinzenta e acendo um cigarro. Mais um desbravador a percorrer os caminhos do câncer.
Na estante os livros que li tantas vezes, mas não leio mais, e, do retrato, meu filho parece convocar-me para aquela conversa milhões de vezes adiada e que, agora, perdeu o sentido.
Fui e sou um caçador de momentos mudados em séculos de solidão que já nem dói mais por ser tão costumeira. Eu sou a própria solidão com seus pavores abissais, covardia estampada no rosto e versos inúteis. De onde vim é exatamente onde estou: um solitário útero em que procuro sobreviver aos nove milênios de esperas.
Nos metros quadrados construídos para risos e projetos, pairo, lentamente, levado pelas manias cotidianas de olhar o rio, tentar escrever e lembrar. Ah, lembrar... Se não fosse isso, seria aquilo; não fosse a escolha, seria o quê? Melhor? Pior? Talvez a mesma penitência; quem sabe esse é o destino do homem em seus latifúndios de imperito viver.
E a pasmaceira desta vida perplexa e modorrenta a escoar pelas fronteiras da sala, do quarto e do espelho sem uso. A barba por fazer e amanhã já é sábado. Roda moinho, roda-gigante, roda moinho, roda pião, o tempo passou num instante...
O que diziam os livros que nem lembro mais? E qual seria a conversa com meu filho tantas vezes adiada? Vai ver, ele também não sabe, pois nem era tão importante, digna de ser recordada.
É pouco, é muito pouco o muito acumulado; não dá para trocar a vida numa concessionária.
Entorpecer, entorpecer, entorpecer... Conhaque não é o mesmo que absinto.
Alberto Cohen
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